Pai, Mãe e Filho
Por: Cleide Martins
Em termos simbólicos e filosóficos, o dogma da Santíssima Trindade representa a manifestação de uma relação profunda e indestrutível entre paternidade-amor-filho.
Essa reflexão se fundamenta na observação de que a Santíssima Trindade revelada pela Igreja Católica não apresenta a figura da mãe e sim, revela a crença na unidade divina: o Deus único que encarnou, a paternidade manifesta-se no Filho, através do Amor, simbolizado pelo Espírito Santo.
Enganamo-nos ao pensar que no ato humano da criação, em que pai-mãe se fundem para receber um espírito e criar um novo ser, repete-se a manifestação dessa unidade.
Na verdade, pai, mãe e espírito promovem uma fusão da qual é gerada um novo ser – o filho – que irá encarnar uma nova personalidade. Portanto, há um quarto elemento: a trindade traz a quaternidade.
Para Jung, a quaternidade é o símbolo da perfeição. Pai e Mãe, na Psicologia Analítica, representam mais do que os pais biológicos: são figuras arquetípicas, representam os guias, os orientadores espirituais.
Para Jung, a quaternidade é o símbolo da perfeição. Pai e Mãe, na Psicologia Analítica, representam mais do que os pais biológicos: são figuras arquetípicas, representam os guias, os orientadores espirituais.
Desses arquétipos temos a matriz que norteará as figuras pessoais com características do masculino e do feminino: o pai e a mãe pessoal. Em linhas breves e gerais, podemos dizer que ao Pai compete o papel de proteção, organização, o provedor, aquele que discrimina e educa. À mãe, compete basicamente a nutrição, acolhimento, afeto. Ao filho, podemos atribuir o papel de aprendiz que um dia assumirá a função de pai ou de mãe, assim sucessivamente...
Embora dito assim pareça tão simples, sabemos que não o é. Nessa vida de relação complexa e povoada por tantas experiências ora positivas, ora negativas, temos falhado no exercício desses papéis. Assim, tem sido comum assistirmos a situações em que o pai faz o papel de mãe, a mãe exerce a função paterna e filhos não são filhos, mas sim os próprios pais de seus pais. Fosse fácil, os consultórios de psicologia, psico-pedagogia, pediatria e neurologia não teriam tantos clientes.
Se pararmos para pensar nessa forte, intrínseca e primordial relação, provavelmente encontraremos na base de nossos conflitos, dificuldades e doenças referentes à relação paterna e materna. De onde se originaram nossas questões fundamentais? Como? E por quê?
Olhemos para nossa dificuldade de amar, de deixar ser amado, de entrega, de confiança, de segurança, de equilíbrio e perguntemos: Tivemos uma mãe amorosa em nossa infância? Como foi essa relação na adolescência?
Olhemos para nossa dificuldade de saber qual é nossa vocação, de escolher os amigos e os parceiros, de nos realizarmos profissionalmente, de lidar com dinheiro e perguntemos: Tivemos um pai dedicado a nos ensinar tudo isso? Como foi a disciplina em nossa infância e na adolescência?
Caso as respostas a essas perguntas sejam negativas, isto é, não tivemos uma mãe amorosa nem um pai disciplinador, teremos de fato muita dificuldade para lidar com as coisas simples da vida, como a de escolher um parceiro adequado, manter-se num emprego, gastar e economizar.
Acreditamos que até aqui não haja nenhuma novidade para o nosso leitor. Então perguntamos: Por que é tão difícil olhar para dentro de nós, enxergarmos essas limitações e lidar com os nossos afetos, a nossa relação paterna, materna e filial?
A inversão de papéis é muito comum nos dias atuais. Originalmente, o pai, que provê o espermatozóide, é o provedor; a mãe, que acolhe no seu ventre a nova vida, é a nutridora. Entretanto, como hoje se vê, muitas vezes a mãe sai do lar para buscar o alimento e o pai fica em casa no papel de ventre: acolhe, recebe, nutre.
Quais as conseqüências dessas mudanças? Serão elas conscientes e elaboradas? Satisfazem o ego daqueles que passam pela experiência e dos filhos que vivem a mudança? Não sabemos.
Sabemos que as respostas não são encontradas no momento em que surgem as perguntas. A história da civilização demonstra que, somente algum tempo depois de vividos os conflitos, conseguimos compreende-los e a eles responder. Mas, isso não nos impede de refletir e perguntar:
Será que estamos passando por uma transição que nos levará à síntese das funções femininas e masculinas? Considerando que o Espírito não tem sexo, pois a distinção do sexo existe apenas na polarização homem e mulher, experimentados na encarnação, nossa essência espiritual reúne ambas as energias: masculina e feminina.
As perguntas que deixamos para reflexão, portanto, seriam estas: A partir do momento em que estamos conscientes dessas duas pulsações dentro de nós, estaremos vivendo uma preparação para a unidade? Como atuar com elas, vibrando dentro de nós, sem criar mais problemas e procurando tirar melhor proveito para as relações humanas?
Voltando à questão da trindade. Será que a imagem Divina, enquanto criadora, é mesmo menino e menina? Daí, poderíamos supor que a Santíssima Trindade seria uma Santíssima Quaternidade? DEUS PAI, MÃE, FILHO E ESPÍRITO SANTO?
Assim, teríamos, o círculo perfeito, da unidade, transcendendo o triângulo amoroso, conduzindo o homem/mulher a caminho da perfeição?
Por.: Cleide Martins
Referência.: Revista Delfos
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