sábado, 11 de dezembro de 2010

A Violeta

Havia num bosque isolado uma bonita violeta que vivia satisfeita entre suas companheiras.
    Certa manhã, levantou a cabeça e viu uma rosa que se balançava acima dela, 
radiante e orgulhosa. Gemeu a violeta, 
dizendo: "Pouca sorte tenho eu entre as flores! 
Humilde o meu destino! 
Vivo pegada à terra, e não posso só levantar a face ao sol como fazem as rosas."
     A natureza ouviu, e disse à violeta:
 "Que te aconteceu, filhinha? 
As vãs ambições apoderaram-se de ti?
     - "Suplico-te, ó Mãe poderosa", disse a violeta. 
"Transforma-me numa rosa, por um dia só que seja."
     - "Tu não sabes o que estás pedindo", retrucou a natureza. 
"Ignoras o que se esconde de infortúnios atrás das aparentes grandezas."
     - "Transforma-me numa rosa esbelta e alta", insistiu a violeta. 
"E tudo o que me acontecer será a conseqüência 
dos meus próprios desejos e aspirações."

     A natureza estendeu a mão mágica, e a violeta tornou-se uma rosa suntuosa.

     Na tarde daquele dia, o céu escureceu-se, 
e os ventos e a chuva devastaram o bosque. 
As árvores e as rosas foram abatidas. 
Somente as humildes violetas escaparam ao massacre. 
E uma delas, olhando em volta de si, 
gritou às companheiras: 
"Hei, vejam o que a tempestade 
fez das grandes plantas que se levantavam 
com orgulho e impertinência."

     Disse outra: 
"Nós nos apegamos à terra; mas escapamos à fúria dos furacões."

     Disse uma terceira: 
"Somos pequenas e humildes; mas as tempestades nada podem contra nós."


     Então a rainha das violetas viu a rosa que tinha sido 
violeta, estendida no chão como morta. E disse:
     - "Vejam e meditem, minhas filhas, sobre a sorte da violeta 
que as ambições iludiram. 
Que seu infortúnio lhes sirva de exemplo!"
     Ouvindo estas palavras, a rosa agonizante estremeceu e,
 apelando para todas as suas forças, disse com voz entrecortada:
     - "Ouvi, vós, ignorantes, satisfeitas, covardes. 
Ontem, eu era como vós, humilde e segura. 
Mas a satisfação que me protegia também me limitava.
 Podia continuar a viver como vós, pegada à terra, 
até que o inverno me devolvesse em sua
 neve e me levasse para 
o silêncio eterno sem que soubesse dos segredos 
e glórias da vida mais do que as inúmeras 
gerações de violetas, desde que houve violetas. 
Mas escutai no silêncio da noite e ouvi o 
mundo superior dizer a este mundo: 
O alvo da vida é atingir o que há além da vida. 
Pedi então à natureza - que nada mais é do 
que a exteriorização de nossos sonhos invisíveis -
 'transforma-me em rosa'. 
E a natureza acedeu ao meu desejo.
     "Vivi uma hora como rosa. 
Vivi uma hora como rainha. 
Vi o mundo pelos olhos das rosas. 
Ouvi a melodia do éter com o ouvido das rosas. 
Acariciei a luz com as pétalas das rosas. 
Pode alguma de vós vangloriar-se de tal honra?
 Morro agora, levando na alma o que nenhuma
 violeta jamais experimentara. 
Morro sabendo o que há atrás dos horizontes 
estreitos onde nascera, 
por que é esse o alvo da vida."

Khalil Gibran Khalil

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